eita a cerveja ainda braia!
A Michelada está fora da Copa, para a tristeza da torcida mexicana
A notícia da lei seca, anunciada a poucos dias da Copa, deve ter enlouquecido torcedores brasileiros, alemães e ingleses, entre outros, que tomam cerveja religiosamente. Ou franceses e argentinos, que não vivem sem vinho. Algum tipo de reembolso pelo prazer reprimido e pelo grito contido?
Os funcionários da alfândega no Qatar devem estar trabalhando em dobro. Frascos de perfume com gim, garrafinhas de frigobar nas meias e cuecas, coquetéis em pó e outras providências criativas certamente foram tomadas por quem não pode pagar os cambistas do álcool clandestino.
Se a questão era o decoro etílico, poderiam liberar ao menos a cerveja, que tem teor alcoólico muito baixo e o preço muito alto para países em que o câmbio não facilita. Já seria uma combinação bastante restritiva.
A torcida mexicana vai ficar sem a popular michelada, mistura mutante que pode assumir formas espantosas. No país dos maias e astecas existe, por exemplo, um troço chamado gomichela. Se você assistir ao primeiro episódio da série "La Divina Gula" (Netflix), sobre a culinária mexicana, vai ver copos gigantes encimados por balas de goma e molhos doces. Dentro: cerveja e tabasco. No, no señor.
O narrador afirma logo de cara: "Que me perdoem os puristas, mas na michelada o mais importante não é que tipo de cerveja você usa e sim o que você acrescenta a ela."
A michelada simples e tradicional é a gomichela sem as jujubas. Às vezes entra no mix o clamato, suco de tomate com caldo de mexilhão. Botar gelo é opcional. E a cerveja, ingrediente predominante, pode ser clara, escura, chope, ipa, de trigo etc.
Surgiu em algum ponto dos anos 1970, em San Luis Potosí Um sujeito chegou ao bar do clube de futebol local e pediu uma cerveja, ou chela, como é conhecida por lá (parece que vem de "chilled", gelada). Insatisfeito com a temperatura e o gosto da bebida, adicionou gelo, sal, pimenta, molho inglês e limão. Seu nome? Michel.
Há outra explicação para o batismo da bebida: "mi chela helada", minha breja gelada. Etimologias à parte, a mistura, que uns dizem ser bem mais antiga, ganhou força e também novos ingredientes. Há micheladas com camarões, vodca, frutas e carne seca. Você recebe a escultura pirotécnica e jura que viu algo se mexer entre o canudo e as lascas de manga: levem-nos ao seu líder.
Dessas mutações, uma das mais opulentas é a michecoco, preparada no próprio coco, com tudo que você tem direito ou sequer sonhou. Abacaxi? Tem. Amendoim japonês? Tem. Maionese, batata palha? É possível.
Dizem que a michelada, esse drinque em tudo oposto ao classudo dry martini, e que bate as poções tiki no quesito fantasia (as montagens exuberantes vão de Carmen Miranda a Clóvis Bornay), cura la cruda (ressaca).
Acredita-se que a pimenta faz suar as toxinas. Infelizmente, o que se elimina com as malagueñas é quase 100% água, o que só piora a condição do infortunado. "Nos gusta la gastrite", explica um bem-humorado barman de Durango.
Os torcedores mexicanos em Doha podem não sair decepcionados com seu escrete na fase de grupos. Com a garganta mais seca que o mar de areia, porém, vão clamar por uma micheladita. "Aqui na terra tão jogando futebol…"
MICHELADA
15 ml de suco de limão
Duas espirradas de molho de pimenta
5 ml de molho inglês
Cerca de 250 ml de cerveja
Passo a passo
Salgue a borda de um copo alto gelado ou caneca. Ponha os primeiros ingredientes e mexa. Complete com gelo (opcional) e cerveja.
Daniel de Mesquita Benevides.
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